segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Aquarela

Maravilhas do mundo transpiram harmonia, onde os sentidos falam, sem que palavras sejam precisas, tal que as idéias fluem simples e claras na nossa mente como uma página em branco. Um espaço livre, onde colocamos todos os nossos sonhos, toda a nossa imaginação. Cenas completas com fundo musical e palavras certas, finais e desfechos inesperados.
         De onde provém, no entanto, essa beleza arraigada daquilo que é único? Não de uma contraposição teórica, mas de uma concepção muito profunda que ultrapassa explicações da divindade. Ao longe entoa a música. Com uma tela e um pincel, dou meus primeiros rabiscos de um sol amarelo chartreuse yellow com um tom alaranjado, e vejo de minha janela que lá fora a chuva e o vento que agitavam com furor as árvores começam a cessar, então eu continuo, assim percebendo um grande poder... agora com cinco ou seis retas, corro o pincel e dou forma ao meu castelo de argila. Fechei meus olhos, e lá estava eu numa gravidade, numa força forte, eletromagnetismo e uma força fraca, numa resultante à superfície da Terra, da atracção da massa e da pseudo força centrífuga, pareço uma linda gaivota a voar no céu, contornando a imensa curva norte e sul. Embarco nas asas da imaginção, tudo é possivel quando sentimos, tudo é possivel quando cremos  e quando temos um coração cheio de amor.
           Mas há muitos que se colocam frente a si e a seu destino desnudado do aparato lógico que por fim não se vê diante de um sistema de idéias, mas diante de fatos, e precisamente de um fato fundamental que nenhuma lógica pode explicar. Continuo a voar, é tanto céu e mar, vejo tudo daqui de cima, entre as nuvens vou surgindo, viajando para o Havaí, Pequim e Istambul, no peito carrego a certeza de que é possível ir alem do que pensaria poder, e no coração a saudade do beijo azul. Abro meus olhos, e vejo uma nova tela, uma nova página em branco. Fico ali, intacto na presença da força latente da esperança, ostentando serena aliança com as lembranças. Corro o pincel e pinto um barco à vela brando navegando, basta imaginar ele está partindo, sereno e lindo. Lá traz na velha ponte eu fiquei em dúvida se atravessaria nadando ou se pegaria o velho barquinho e ir no máximo que conseguisse, e cá estou eu, com um simples compasso eu giro e faço um mundo e atravesso de uma América a outra encontrando com alguns bons amigos.
Pensamentos e imagens se chocam dentro de minha cabeça, perco os sentidos e deixo cair um pinguinho de tinta que escorre até a borda da tela, se desprende e cai sobre a ponta de meu velho sapato. Desconcentrado eu me levanto e vou em direção a janela, e de lá eu vejo o sol chartreuse amarelo, vejo um imenso castelo de argila, sobre as nuvens surge um avião rosa grená, tudo em volta colorido, gaivotas a revoarem, e agora eu era um menino, fiquei surpreso, então fechei meus olhos e vi tudo em branco, ao longe a música ainda entoava, comecei a caminhar numa linda passarela de uma aquarela, sem tempo, sem piedade, e sem hora, rumo ao futuro sem pedir licença, eu caminhava e caminhando cheguei num muro, olhei para traz e via apenas imagens do meu passado. Tornei a olhar para frente e muro ainda jazia intacto.
Abri meus olhos e estava eu ali na janela ao som da chuva que insistentemente caía do lado de fora, as árvores balançando com o furor do vento. Tudo tinha sumido, não havia mais sol e nem castelo, voltei para as minhas telas e estavam todas ali em branco, nada de cinco e seis retas, e nada de rabiscos. Sentei-me e fiquei a observar aquelas páginas em branco quando por fim avistei que na ponta de um par do meu velho sapato havia um pinguinho de tinta, então percebi que tudo tinha sido real, percebi que os sentidos falam, sem que palavras sejam precisas, tal que as idéias e imaginações fluem simples e claras em nossa mente como uma página em branco, um espaço livre onde a cada manhã temos a grande oportunidade de pintar o nosso dia, de pintar o nosso futuro. Correndo o pincel e dar forma aos nossos sonhos, com cenas completas e desenhos certos. Finais e desfechos inesperados vai depender de cada um, pois a tela já pintada ninguém descolorirá.


- Inspirado na música Aquarela, de Toquinho.

Autor: Jonathas Eliel

2 comentários:

  1. "Pois a tela já pintada ninguém descolorirá"
    Parabéns pela sensibilidade desse texto, realmente muito bonito!!!

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  2. Cara que mensagem bonita esse texto nos passa! Tambem, cai entre nós,quando se insprira em uma musica linda como a Aquarela, o resultado é esse texto magnifico! Parabens!

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